O direito ao debate


Com 38 anos (completados no último dia 15 de Novembro) Buffon chegou à 167 internacionalizações, empatando com Iker Casillas (Espanha) e Vitālijs Astafjevs (Letônia) nos jogadores mais convocados de todos os tempos. Caso tudo ocorra dentro da normalidade e não seja afetado por lesões e/ou super-momentos dos seus "concorrentes" italianos - Gianluigi Donnarumma está certamente à espreita da oportunidade -, no final de 2017 o arqueiro da Juventus terá com toda a certeza ultrapassado Hossam Hassan (Egito) e, na pior das hipóteses, será o segundo classificado desta lista, atrás apenas de Ahmed Hassan (também do Egito). 

O goleiro já afirmou querer jogar pelo menos mais um Mundial, contando com isso, baterá este recorde e pode até tornar-se o primeiro jogador a galgar a barreira dos 200 jogos por uma seleção, dependendo da atuação da Itália no país dos Czares (acrescentamos, mesmo que até ao final do Mundial de 2018 a contagem esteja abaixo do número redondo, possivelmente tanto jogador como federação farão todos os esforços para atingir a marca, que será histórica).

Campeão mundial e "sub-continental" (Taça UEFA), vários outros títulos individuais e coletivos catapultam Buffon para o Olimpo dos guarda-redes. Como concorrente maior ao título hipotético de melhor goleiro italiano de todos os tempos, temos Dino Zoff. Dono de uma carreira invejável, com 112 internacionalizações pela seleção italiana - numa época em que os jogos entre nações eram menos regulares que nos dias de hoje -, vários títulos nacionais, continentais e internacionais, foi o melhor arqueiro da sua geração, embora haja quem advogue pelo alemão Sepp Maier (também um dos melhores de todos os tempos).

Trazemos este registo para a mesa para abordar um tema muito mais profundo que a comparação entre dois jogadores, que sempre gera debate nos estádios, nas mesas de café e na esfera virtual: Modernismo vs Saudosismo. Os termos são fortes, ninguém quer ser apelidado de qualquer um dos dois por achar um jogador contemporâneo superior a um dos tempos antigos, e vice-versa; e embora haja outros exemplos que colocam frente a frente jogadores de gerações diferentes, como Lahm e Vogts ou Messi e Maradona/Di Stéfano, esta "batalha" de goleiros é talvez a que melhor personifica a eterna discussão.
O antes e o agora. Embate rotineiro nas rodas de discussão do futebol.

Dois homens excepcionais, onde a preferência fica unicamente na opinião. De um lado, o apelidado de "saudosismo". Quem fez primeiro, fez melhor. Quem fez com menos preparação estrutural e logística, é mais idôneo. O mérito do vanguardismo sobre a execução. Do outro, o "modernismo". O agora é sempre superior. O "ver" sempre tem vantagem sobre a documentação. A teoria da máquina do tempo. Ninguém pode afirmar que Pelé seria igualmente gigante nos dias de hoje, em que os esquemas defensivos estão mais bem preparados para "sufocar" os craques; tal como não seria realista pensar que Messi seria hours concours numa época em que as entradas assassinas eram apanágio, e a proteção aos melhores jogadores - como, por exemplo, a amostragem de cartões -, não eram nem uma miragem.

Então, no fundo, por que não pode um jogador do antigamente ser melhor que um da contemporaneidade? Em que lote colocamos mitos do esporte, como Giuseppe Meazza, Matthias Sindelar ou György Sárosi? No espectro oposto, o que um jogador de hoje tem de fazer para igualar ou ultrapassar os monstros do passado? Terá invariavelmente e injustamente que fazer pelo menos um pouco mais para igualar? É assim tão descabido achar que Hazard é superior a Paul Van Himst? Shevchenko melhor que Blokhin? Iniesta acima de Luis Suárez Miramontes? 

Nada é ridículo na tomada de uma posição. Ninguém é dono da verdade. Nenhum argumento é melhor que outro. Cabe a cada um fazer a sua leitura e formar a sua opinião. Informada. Consciente.
O debate, esse, estará sempre aberto.
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