Bom, deixo claro aqui que, pra esse que vos escreve, a ideia de que o Cristiano Ronaldo não tem tanto talento ou mesmo que é mais treinamento que talento, é errada. Mas enfim, é comum que o título de "jogador mais atleta da história" acabe fendendo o gajo da genialidade. Muitos acham impossível um jogador que precisa treinar tanto para estar no nível que esteve ser genial. No entanto, uma coisa me chamou atenção: Francis Galton, no século XIX, catalogou a família de pessoas geniais para o seu livro Hereditary Genius. Nessa pesquisa, Galton descobre uma chance muito maior de juízes ou cientistas estarem na mesma família, afinal, temos 7 famílias com pais e filhos que ganharam o Nobel, o que pode significar uma relação genética mas também uma relação ambiental - ou seja, não inata. Por exemplo o caso de Irène Joliot-Curie, gênia da química, que foi estudar no laboratório de sua mãe - Marie Curie - desde criança. Há também o caso de Wolfgang Mozart, filho do também músico Leopold Mozart, que com talento nato ou não, foi treinado pelo pai de maneira incessante e até exagerada desde os 4 anos. Até que ponto essa genialidade de ambos se deve à inclinação natural ou ao treinamento suado? Assim como no jogo Star Garen, o talento natural ajuda, mas é preciso ter acesso aos dragões para conquistar o mundo.
Cristiano Ronaldo nos treinos: aplicação e dedicação ao extremo para extrair o máximo de seu talento nos jogos. |
No livro "Genius, a very short introduction", de Andrew Robinson, de 2011, o autor conta que uma das únicas relações familiares/genéticas encontradas é bem surpreendente: a perda de um ou ambos os pais na juventude é 3 vezes maior em pessoas geniais do que na população comum. Isso resultou na teoria de que eles passaram a focar mais em uma área para lidar com a solidão ou saber controlar uma grande perda. Coincidentemente, o pai de Cristiano morreu quando ele tinha 20 anos.
Importante que para os especialistas, todo gênio tem inteligência acima da média, mas uma inteligência acima da média não garante que o dono seja genial, o que leva a crer na importância do exercício dessa inteligência para tornar-se gênio, afinal, como disse o também gênio Thomas Edison, "genialidade é 1% inspiração e 99% transpiração". Isso não foge muito da realidade, tanto que áreas que são desenvolvidas mais individualmente, como a Literatura, não há nenhum caso de famílias nobelistas, já a Matemática, que não tem Nobel, mas que também depende de muito esforço individual, foi um dos casos que Galton encontrou a menor relação entre genialidade e genética. Mesmo em áreas como esportes olímpicos e xadrez, que avançaram tanto nos tempos modernos, levando à consolidação dos maiores gênios de suas mobilidades e de quebra de recordes, não podem ser relacionados à genética, à inclinação natural ou a algo inato, mas sim pelos avanços em técnicas de treino, método de práticas e seleção de talentos. Até por isso os especialistas se apropriaram da máxima: "mais importante que onde você está, é a mentalidade de querer melhorar sempre".
Exemplificando: cientificamente, não há nenhuma prova de inaptidão inata em algum dos sexos ou etnologia para cálculos matemáticos. Segundo o livro "The Only Woman in the Room", a habilidade matemática das meninas até os 12 anos é igual - se não maior - que a dos meninos, mas passado esse período, alguns estereótipos e a falta de estímulos acabam afastando as mulheres de exercitarem essa área, intricando o desenvolvimento de sua genialidade. Indo direto ao ponto, a necessidade de aliar o talento com o treino na consolidação de um gênio pode ser observada em imagens como a da Conferência de Solvay(foto acima) que, em meio a dezenas de gênios do século passado, encontra-se apenas brancos e somente uma mulher, reflexo do desestímulo sobre a prática científica sobre outras etnias e sobre o sexo feminino.
Conferência de Solvay, 1927. |
Quando falamos da dedicação e esforço de Cristiano Ronaldo, temos que tratá-los com cuidado, se não acabamos caindo em um erro bastante comum. Ele não é um dos maiores de todos os tempos só porque se mata nos treinos. Isso é muito, mas não é tudo. É válido lembrar que o estilo de jogo do Cristiano de hoje é bem diferente do estilo de 10 anos atrás. E ele continua no topo. Isso envolve não só condição, mas também mentalidade, talento e muita técnica.
Cristiano Ronaldo conseguir bater o Messi por diversas vezes nessa era, é como o semi-deus Hércules bater Ares, o deus da guerra, na mitologia grega. A prova que com esforço e a mentalidade certa, você pode se igualar aos gênios, privilegiados, deuses. É a inspiração que precisamos, mas que não merecemos.