O Herói de Sangue

Quem atualmente olha a escalação do Real Madrid, vê diversos jogadores habilidosos, estrelas, verdadeiros craques que seriam titulares em praticamente qualquer time do mundo. Diversas dessas estrelas são até consideradas “coadjuvantes de luxo”, como James ou Kroos, visto que o estrelismo fica por conta do trio BBC, e claro, o maior de todos os nomes é sem dúvida o atual melhor do mundo, Cristiano Ronaldo.

Porém, como é de costume em qualquer grande equipe da história do futebol mundial, alguém faz o trabalho sujo, pra alguma estrela brilhar. Não precisamos voltar muito no tempo para encontramos exemplos de jogadores que se dedicavam exclusivamente na marcação para que alguém se dedicasse em atacar. Gattuso era assim no Milan da década passada, Walter Samuel e –principalmente- Materazzi eram açougueiros na Inter penta campeã do Calcio, Roy Keane fazia esse serviço para Scholes pensar para o United, Gilberto Silva carregava o piano no penta brasileiro entre outras dezenas de casos que ocorreram através dos tempos no mundo da bola.

Normalmente esse homem do “trabalho sujo” é um volante, mas, voltando ao atual Real Madrid, vemos que a situação é um pouco diferente: Toni Kroos é o único volante na escalação titular da equipe, sendo o alemão peça extremamente importante para o funcionamento ofensivo do time, entretanto, fraco defensivamente para os padrões da volância, mas se olharmos uma linha mais atrás, vamos encontrar o homem que limpa a barra, e não, não é o Pepe (por incrível que isso parecesse há duas temporadas atrás).

O nome desse homem é Sergio Ramos. Há 10 anos no clube madridista, o atual zagueiro já passou por vários momentos importantes nesses anos de Madrid.

O atual vice capitão chegou ao clube em 2005, com 19 anos de idade e logo na chegada teve que lidar com duas pressões: custou 27M de euros, alto valor para os padrões da época e para um defensor de sua idade, e ainda teve que honrar o número 4 carregado nas costas, herdado da lenda Fernando Hierro. O intuito desse texto não é contar o histórico do defensor sevillano, mas sim comentar sobre esse guerreiro após 25 de abril de 2012.

Nesse fatídico dia, o Real Madrid foi a campo contra o Bayern de Munique pelo jogo de volta da semifinal da UEFA Champions League, e precisava vencer para manter vivo o sonho da La Decima naquele momento. Todo o time, incluindo Sergio, foi bem naquele jogo, conseguindo a vitória por 2 x 1, repetindo o placar da ida levando assim o jogo para a disputa de penais. CR7 e Kaká erraram para o lado blanco, Kroos e Lahm desperdiçaram as cobranças para os bávaros, até que Sergio Ramos faz a cobrança da marca da cal e envia a bola para a Lua, e em seguida, Schweinsteiger converteu sua cobrança, colocando o Bayern nas final e adiando a esperada La Decima, que naquele momento era um sonho tão longe quanto a bola chutada pelo camisa 4 de Madrid.

Mas, como o bom e velho ditado diz, ‘há males que vem para bem’. E assim foi com Sergio, que após o baque de “eliminar” seu time da UCL, soube dar a volta por cima e crescer de produção temporada após temporada. Nesses anos que se passaram, o sevillano se firmou no miolo da zaga e por ali encontrou o melhor momento de sua carreira, sendo tido como um dos melhores zagueiros do mundo no momento. Em campo, o camisa 4 mostra várias qualidades que demonstram o grande zagueiro que é, como a excelente qualidade de marcação e desarme, velocidade de recuperação (graças aos tempos de lateral direito), técnica para sair jogando, e claro, raça, pois sem duvidas, o espanhol é o jogador ‘com mais sangue’ do elenco blanco atual. Raramente entra em um jogo relaxado, sempre tenta dar seu máximo em campo, seja com carrinhos e entradas duras (que fazem dele um dos jogadores que mais vezes foram amarelados pelo Real), ou agindo como o vice capitão que é, gritando, organizando, incentivando seus companheiros contra possíveis adversidades e sempre que possível, chamando/inflamando a torcida. Se o Real Madrid é tido de maneira errônea por alguns, como um time frio, de estrelismo e sem paixão, é bem claro que SR4 foge desse conceito pífio e prova a cada jogo importante que seu coração pulsa como se aquele fosse o último jogo de sua carreira. E como esse jogador cresce em jogo importante, parece preferir enfrentar grandes desafios, demostra jogar melhor quando enfrenta os melhores, sem sombra de dúvidas, Sergio Ramos foi forjado para decidir!
E como decidiu.

Voltaremos um pouco no tempo, para 11 de abril de 2014, dia do sorteio que definiu que Real Madrid e Bayern de Munique se enfrentariam em uma semifinal de UCL, assim como ocorreu em 2012. Era a vez de Sergio enfrentar e vingar a maior mancha de sua carreira pelo clube da capital espanhola. Titular em ambos os jogos dessa semifinal, SR4 e toda a defesa madridista mereceram suas glorias por não concedem um único gol ao time alemão em 180 minutos de disputa, já que o RM venceu a ida por 1x0 e a volta por 0x4, calando a Allianz Arena com dois gols de Cristiano e um ‘doblete’ em duas belíssimas cabeçadas de Sergio Ramos. O demônio havia sido exorcizado e a Bavária havia sido calada, Ramos colocava o Real Madrid na final de UEFA Champions League após 12 anos, e logo contra os rivais da capital, o Atlético de Madrid.

Era a hora de atingir o maior sonho do clube, e logo contra um grande adversário. Mas o Atleti saiu na frente, o estrelado trio ofensivo BBC não conseguia produzir, o jogo caminhava a passos largos para a vitória ‘rojiblanca’, até que um escanteio é cavado, os zagueiros sobem ao ataque, tensão estampada na face de todos no Estádio da Luz, Lukita Modric na bola, 92:48, ele salva novamente! Sergio Ramos se adianta a Tiago e testa para o fundo do gol, garantindo o empate e a prorrogação, onde o RM golearia e daria números finais ao confronto, 4x1, a La Decima chegou, graças a cabeça do mais passional dos madridistas.


Quase como aquele Super herói que aparece nos piores momentos, pra causar a reviravolta, Sergio aparece para o Madrid e sua ‘aficion’, sempre quando mais precisam dele e da sua vontade. Quando as coisas não vão bem, quando tudo parece que não vai dar certo, Super Ramos surpreende e bate no peito, chama a responsabilidade e decide. No início desse texto, citei homens que carregavam pianos pra estrelas brilharem, e Ramos não foge desse conceito. Ele é zagueiro, num clube que sofre pouquíssima pressão em 80% dos jogos que disputa na temporada, pouco aparece em sua verdadeira função, e quando aparece, muitas vezes é fazendo o necessário de um zagueiro, que é ‘jogar feio’, mas na hora do jogo grande a situação muda, ele faz seu trabalho como um dos melhores defensores do mundo e ainda resolve na frente, se necessário for, como foi na Baviera, contra o Atleti ou na conquista do mundo.

Sergio Ramos é a personificação de antônimos. É o antônimo de um jogador ‘pipoqueiro’. É o antônimo de um jogador frio e ‘sem sangue’. É um antônimo do falso conceito tido dos jogadores que passam por Chamartín.

Porém, ele é sinônimo também, Sergio Ramos é sinônimo de Real Madrid. Obrigado, Super, que outros 92:48 se repitam.




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