O Homem à Beira do Campo


Hegel, filósofo alemão, criou o conceito de geist que, de forma simplificada, é o conjunto de ideias que definem a história e seu rumo. Trazendo para o nosso querido esporte, podemos dizer que o futebol em um geral segue seu curso, evolui. O futebol brasileiro estagnou, não mudou seu conjunto de ideias, não seguiu seu rumo. Tendo isso em mente, sigamos.

Se nos esforçarmos, conseguimos reduzir uma partida de futebol para a seguinte definição: um embate físico, técnico, tático e psicológico. E é na última característica que reside a maior conquista de Tite no seu precoce trabalho com a seleção. Verdade seja dita, ainda há muito trabalho a ser feito, muito, alguns nomes da sua primeira lista foram criticados, com razão, e existe muito espaço para crescer, afinal, foram apenas dois jogos com Adenor à beira do campo. Mas foram dois jogos em que vimos uma postura extremamente diferente do que estávamos acostumados, a seleção canarinho se postou com mais confiança.

Tite é a renovação, não só tática e técnica, mas psicológica. É a renovação do conjunto de ideias (Geist) que irão definir o novo rumo da seleção nacional. E todos nós sabíamos disso quando seu nome foi anunciado. Pós 7x1, estávamos amargurados e com o ego ferido, havíamos sofrido um tremendo golpe no emocional, desesperados por um nome diferente, uma pessoa que trouxesse o novo. Nos entregaram Dunga, alguém que já havia tentado e falhado, alguém que sequer colocava curativos em nossas feridas emocionais com a seleção, alguém que nos quatro quesitos citados no início do texto, não conseguiu evoluir com nenhum. Aguentamos dois anos. Decepção. Demissão. Veio o nome tão pedido, Adenor Leonardo Bachi, a torcida brasileira então criou esperança que a tão falada renovação viesse através do mesmo. Ainda que não saibamos onde chegaremos, não temos mais a sensação de estagnação. É cedo para falarmos de físico, técnico e tático, mas o psicológico está renovado, e esse fator amigos, consegue compensar algumas lacunas dos outros três.
Confiança e união: fatores primordiais para um trabalho dar certo.

Equador. Estreia do novo técnico contra o vice-líder. Altitude. Desconfiança na escalação. Confiança no homem que escalou. E veio o primeiro detalhe de que estamos a frente de um sujeito que merece a fé depositada nele, a seleção encarou o adversário de cabeça erguida e sem desesperos, os jogadores estavam claramente mais leves, enfrentaram um jogo duro e conseguiram manter as rédeas do mesmo na hora que precisaram. Gol, gol, gol. 3x0.

Colômbia. Jogo de afirmação. Gol no início. É Festa. Gol contra de empate em bola parada. E então é posta à prova dentro de campo o poder de reação da seleção de Tite contra a adversidade básica, mas ainda sim difícil, do futebol, tomar um gol. A resposta não poderia ter sido melhor. A seleção não se desesperou, botou a bola no chão, e, com calma, levou-a ao fundo do barbante. Gol. 2x1.

Nos dias entre um jogo e o outro, um vídeo postado por Neymar mostra 5 dos titulares dançando e “resenhando” no vestiário. De início podemos entender que esse vídeo nada quer dizer, mas quando analisamos a postura dos jogadores dentro de campo, a cena do vestiário claramente se torna sintomática, os selecionados estão com a cabeça tranquila, e isso pode sim ser atribuído a Adenor, vide seus trabalhos recentes. Não confundam as coisas, nenhum dos jogos foi um primor técnico ou tático, há muito a ser feito, e muito a evoluir, mas o psicológico está no caminho certo, a confiança aos poucos é remendada, o time esteve e se postou seguro. 

Os jogadores confiam no homem à beira do campo. Nós confiamos no homem à beira do campo. Partindo, ironicamente, de um conceito alemão de origem, Tite é aquele que devemos crer que se tornará o Geist que nos levará à superação da desilusão com o futebol da seleção nacional.
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