A uma lenda, meu obrigado


Quando mais novo, já com grande admiração pelo futebol argentino, um jogador me chamou atenção. Javier Zanetti era tudo que eu apontava como necessário num lateral. Dosava os momentos certos para atacar, excelente para defender, com muita qualidade no passe e com boa precisão nos cruzamentos. Passei desde ali a tê-lo como referência. Um bom lateral tenderia a ser parecido com aquilo, o quanto mais próximo disso era o ideal. Mesmo em fim de carreira presenciar atuações memoráveis como a da final da Champions League de 2009-2010, onde foi essencial para parar o ataque alemão, me impressionavam. Mas do outro lado estava outro grande nome que sem perceber eu deixava passar como se fosse qualquer um. Porém, foi um gigante.

07/02/2017. Nesta data Phillip Lahm anuncia que se aposentará ao final da temporada, após recém completar 500 jogos pelo Bayern de Munique. Um líder, um vencedor, um símbolo.

Lahm dedicou quase a sua carreira inteira ao Bayern, saindo apenas ao Stuttgart quando jovem. Foi naquele ano de 2010, quando começava a ter um entendimento mais apurado do esporte, que comecei a notar o jogador especial que era o alemão. Ele já era considerado um dos melhores da posição na sua época. Jogava pelos dois lados sem prejuízo algum ao seu desempenho. Sua inteligência, sua consistência na defesa e a qualidade com a bola nos pés me pareciam muito com o que eu imaginava de Zanetti, o lateral que eu tinha como referência.

Porém, sua história não começa em 2010. Muito antes na verdade. Em 2004 já jogava na seleção, tanto que chegou a ser eleito o segundo melhor alemão do ano. Em 2006, fazia o primeiro gol da seleção alemã que jogava diante de sua torcida. Seleção de nomes como Schweinsteiger, Klose, Mertesacker, Podolski, que teriam sua glória no futuro, cairia para a campeã Itália. Em 2010, ao lado de outros como Neuer, Boateng, Khedira, Ozil e Muller cairia novamente para os futuros campeões, os espanhóis, na sua mais brilhante geração. 2014 seria a consagração de todos esses. A seleção alemã, venceu a copa de forma incontestável. Goleada histórica na seleção brasileira que jogava em casa e vitória na final sobre a forte seleção argentina de Lionel Messi. Consagração de toda uma grande geração, mas talvez ninguém merecesse mais que o lateral que se exibiu em nível exemplar na competição mais importante do futebol mundial nas três vezes que a disputou. Lahm pôs fim a sua história na seleção na melhor forma possível, como consagrado capitão que levantaria a taça.
Pela seleção, encerrou da melhor forma possível.

Nesses longos hiatos de tempo entre uma copa e outra, o nível era o mesmo. Por um bom tempo, não era exagero algum perguntar quem era o melhor lateral esquerdo ou direito do mundo e ouvir a mesma resposta: Phillip Lahm. Com muita dificuldade talvez você até encontrasse algum lateral que marcasse melhor. Contando nos dedos citaria nomes melhores no apoio. Mas simplesmente não havia quem fizesse as duas coisas com tamanha eficiência. Mesmo em momentos mais difíceis, ou na arrasadora equipe de Juup Heynckes, o nível do defensor era altíssimo. Com o genial Pep Guardiola, passou para o meio, ainda funcionando em alto nível, com Lahm ajudando a ditar o ritmo de jogo e ajustando o sistema defensivo. O super vitorioso treinador espanhol (de frases por vezes exageradas é verdade) chegou a declarar que Lahm foi o jogador mais inteligente que já tinha treinado. Provável exagero de quem antes tinha trabalhado com nomes como Xavi, Henry, Messi e Iniesta, porém, isso pouco importa, sua noção de posicionamento, tomada de decisão para avançar nos momentos certos e a concentração e frieza típica dos jogadores alemães ajudaram a tornar o jogador de apenas 1,70m num gigante.

Com 24 títulos (lista que pode até o final da temporada aumentar), o capitão de um dos maiores times do mundo deixará o futebol. Segundo o próprio, não pretende ser treinador e não tão cedo ser dirigente. Aos 33 anos, alguns podem dizer que ainda poderia ter mais a entregar e provavelmente estarão certos, mas o jogador resolveu não manchar sua imagem com uma possível decadência acentuada no seu futebol, ou jogar em equipes de menor nível, apenas por dinheiro.

Para aqueles que recentemente passaram a acompanhar e puderam ver o que ele era capaz de jogar pela lateral, eu vos digo: tenham esse cara como referência. Como para mim foi Zanetti. Um agradecimento sincero de um fã a Phillip Lahm, um lateral direito, esquerdo ou volante. Mais que isso, uma lenda.
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