Herdei os cabelos grossos e o andar cansado de meu pai. De minha mãe as olheiras profundas e a boca pequena. Herdei aquilo que hoje me faz homem, aquilo que me faz vivo. São as heranças, então, grande influenciadoras de um futuro sucessor. Da vida.
Você deve estar se perguntando o porque desse texto estar escrito num blog de futebol. Te repreendendo, digo, futebol é vida, e como toda a vida, é feita de heranças de um passado, que constituirão um novo futuro.
Isso é bem explícito quando analisamos os trabalhos dos treinadores. Geralmente, quando um treinador se encarrega de assumir um time, ele herda do seu antecessor os jogadores e parte de sua filosofia de jogo. É possível, a partir daí, escolher entre rechaçar tudo de antes, construindo um novo jogo, com seu estilo e filosofia, ou se apropriar daquilo que restou para montar uma equipe mais coesa.
Até porque, certas heranças são tão "podres" que nem o mais competente dos treinadores ousam se apropriar. Mas, no geral, todos pegam o que é fluído, bom e aproveitável, dispensando o que é podre, como num verdadeiro garimpo que, se bem orientado, pode render ótimos frutos. Inclusive, levando em conta que na atual conjuntura do futebol mundial, faz-se necessário um olhar mais atento para cada esfera do jogo, para cada detalhe que valha a pena, evitando perder verdadeiras jazidas de ouro em meio ao mais denso lamaçal
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| De Dunga, Tite recebeu uma difícil herança, e precisa garimpar muito bem para achar ouro no que era um enorme lamaçal. |
Alguns exemplos dessas heranças produtivas são facilmente encontrados em todas as escalas do jogo, seja no alto escalão ou no modesto campeonato brasileiro.
Barcelona, Luis Henrique e Guardiola
Talvez seja o exemplo mais manjado de todos. No entanto, o jogo dos dois tem diferenças marcantes. Porém, Lucho ainda utiliza algumas coisas implantadas por Pep, como a amplitude provida pelos laterais e a ocupação de espaços no campo ofensivo.
Mas a maior e mais importante herança deixada por Pep, foi a consciência de jogo de Lionel Messi. O jogador se mostra cada vez mais importante na constante movimentação ofensiva proposta por Lucho, e isso, Messi deve muito ao antigo trainador, que o testou em diversas posições. Luis Henrique herdou "apenas" um dos melhores jogadores da historia.
Real Madrid, Mourinho e Carlo Ancelotti:
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| No Real Madrid, Ancelotti foi esperto para usar o que tinha de melhor na equipe de Mourinho. |
Muitos consideravam, na época da "La decima", que o time da capital espanhola detinha o melhor contra-ataque do mundo. Municiado pela fantástica fase de Modric, Di Maria e Cristiano Ronaldo, o time merengue dispunha de uma facilidade imensa de chegar ao gol adversário utilizando poucos toques. Carlo Ancelotti, com méritos, ganhou a todos os aplausos da época. No entanto, seu jogo teve substancial influência de seu antecessor, Mourinho, que sempre foi marcado pela letalidade de seus contra-ataques. Ancelotti merece os méritos pela utilização de Modric e "ressurreição" de Di Maria, fazendo seu jogo encantar o mundo com um jogo bonito de se ver.
Grêmio, Renato Gaúcho e Roger Machado:
Talvez o mais recente dos casos. Mas merece importante destaque. Hoje, o Grêmio de Renato Gaúcho disputa o título da Copa do Brasil, depois de eliminar o líder vigente do Campeonato Brasileiro, e o tradicional Cruzeiro.
Porém, seu jogo ainda guarda marcas visíveis da filosofia de Roger. Principalmente no setor de meio-campo e ataque. Os posicionamentos de Douglas e Luan, por exemplo, continuam os mesmos. E então, o que Renato fez para o time sair da má fase direto para uma final?
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| Douglas é um dos exemplos de herança no futebol: segue desempenhando a mesma função que fazia com Roger. |
Principalmente a defesa. Geromel e Kanemann retomaram a boa fase com o treinador, além de Ramiro e Marcelo Oliveira, antes contestados, hoje se mostrarem úteis no estilo de jogo de Gaúcho.
Saiu da salmoura das praias do Rio, para galgar os gelados ventos libertadores dos pampas.
Ou seja, como na vida, no futebol deve-se prestar atenção em cada parte de cada coisa. Para não perder um ouro escondido em baixo da lama. Deve-se garimpar todos os cantos de um time, por mais terra arrasada que pareça. Por mais lamacento que seja o solo, mais as chances de se encontrar o ouro que levará a glória.